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As múltiplas facetas do “marido da noite” em Languana

“Marido da noite é um espírito da família, que quando tratado passa de um membro

da mesma família para outro, em caso de morte da visada, o espírito é enviado por herança para um

membro da família que seja da mesma linhagem da finada”

In Sara Jona Laisse. Espiritismo Medicina Moçambique. 2020.

 

Os apaixonados, em datas festivas especiais, têm por hábito oferecer um ramo de rosas para simbolizar o amor que um sente pelo outro. Mas não são flores quaisquer! A flor de topo, nesta categoria, é a rosa vermelha. Esta flor é, desde há muito tempo, o símbolo do amor e da paixão. Mas porquê esta e não outra?

Durante séculos, a rosa foi associada ao amor: era a flor preferida de Afrodite (Vénus na mitologia romana), a deusa do amor, da beleza e do desejo!

É num contexto de amor e beleza que o artista plástico Aldino Languana nos convida a percorrer pelooss “Jardins de sonhos”, com os olhos fixos na exposição, concretamente na pintura intitulada “Marido da noite”, onde aparece uma rosa de pétalas vermelhas, como um símbolo do pacto entre a família e o marido da noite.

Como uma criança inocente preocupada em exteriorizar os sentimentos que apreende à sua volta, o pintor levou, na última quarta-feira, 03 de Julho, às paredes da Galeria da Fundação Fernando Couto, em Maputo, a poesia da vida em forma de imagens.

Em Languana a rosa e as cores ganham outros contornos e significados. Ademais, o mais importante não é a rosa em si, nem a cor das pétalas, mas, sim, os espinhos da rosa. Pois, através da narrativa contada pelo artista é possível ver o conflito amoroso existente entre a mulher e o marido da noite, o real e o imaginário.

No retrato, o pintor atribui um novo significado às coisas, onde os espinhos da rosa expressam a angústia que a mulher carrega dentro de si a vida toda por saber que é comprometida com um ser que pertence a uma esfera espiritual (marido da noite).

Por um lado, as pétalas vermelhas representam o sangue derramado pelos ancestrais da mulher durante o pacto, acto da venda da mulher, aos espíritos da família. O caule da rosa é a ligação entre os vivos e os mortos, o que mantem ligado o passado e o presente.

Na sociedade moçambicana, assim como no quadro em análise, não se percebe ao certo se ter marido da noite é algo bom ou mau. O certo é que existe um facto curioso e intrigante entre o real e o imaginário, que desafia os jovens, sobretudo as mulheres a buscarem mais conhecimentos acerca das suas raízes, tradição e o passado da família.

Geralmente, sempre que se fala da paz, na mente ocorre uma imagem de uma pomba voando ou uma cor branca, mas, em “ Marido da noite”, há uma troca de significados, pois a tonalidade do azul do céu, usado no quadro, representa a paz, o conforto e a esperança para uma mulher que se vê presa e condenada a viver e a conviver com um marido escolhido pelos outros.

Entre as nuvens, o azul, surge como uma luz no fundo do túnel, um possível acordo de paz entre o marido da noite e a mulher. No fundo, o autor, através das suas pinceladas, tenta transmitir uma ideia de rompimento com a tradição e libertar a mulher das correntes da tradição.

Também, entre as nuvens surge o corvo que olha tudo de longe sem intervir. Neste contexto, o artista plástico transmite a ideia de que o sofrimento não vem dos espíritos, marido da noite, mas, sim, da ganância das pessoas. Embora os espíritos existam, é dos vivos que surge o tormento na vida.

A troca de significados existente entre as cores e os novos significados atribuídos não retiram a genialidade do artista plástico, também não distorcem a mensagem. Pelo contrário, aumentam a autenticidade e a capacidade do autor em apresentar e representar os problemas que preocupam a sociedade moçambicana, quebrando os preconceitos.

 

Título da exposição: Jardins de sonho
Título da tela: Marido da noite
Autor: Aldino Languana
Dimensões da Tela em análise: Aguarela s/ papel,
125 x 130 cm, 2023

Nota do editor: A individual “Jardins de sonhos”, de Languana, e com curadoria de Yolanda Couto, pode ser visitada na Galeria da Fundação Fernando Leite Couto, em Mapuo, até 3 de Agosto.

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